Tortura ou realização? Os estreitos laços entre trabalho e orientação vocacional/profissional

Nós, seres humanos, devemos nossa sobrevivência às relações sociais. A partir do momento em que nascemos somos cuidados, alimentados, protegidos e enquanto crescemos os outros nos ensinam os mais diversos tipos de coisa.

Nos dias atuais, as crianças vão à escola aprender o básico de que precisarão para um dia contribuírem de forma ativa com essa mesma sociedade que as cuida. Isto é, o crescimento ou fracasso profissional de uma pessoa afeta os seus círculos sociais mais próximos, como por exemplo, sua família, e também círculos sociais mais distantes, como a economia da sua região e do seu país.

De toda forma, mais cedo ou mais tarde, a maioria das pessoas precisa trabalhar para garantir a sua sobrevivência e o jeito como elas lidam com esse fato varia bastante. Isso se relaciona com coisas da vida pessoal de cada um, mas também sofre influência da visão que é compartilhada socialmente a respeito do ato de trabalhar.

A visão coletiva que a sociedade tem sobre o trabalho é algo muito significativo, especialmente no que se refere à forma como as pessoas lidam com essa obrigação. O Mundo do Trabalho é algo que já foi muito estudado e que sofreu transformações em diversos momentos da história, variando conforme o pensamento social de cada época. 

[tie_index]Mas, o que isso tem a ver com Orientação Vocacional/Profissional?[/tie_index]

Mas, o que isso tem a ver com Orientação Vocacional/Profissional?

A justificativa que proponho é que a ideia de se fazer um processo de Orientação Vocacional ou um Teste Vocacional, surgiu e cresceu junto com essas transformações do mundo do trabalho e das visões que se têm dele. Hoje, esse processo ainda é válido e muito importante, mas por motivos diferentes daqueles disseminados em seu nascimento.

Levando tudo isso em consideração, ao longo do post, vamos fazer uma breve retrospectiva histórica para entender como o trabalho e a Orientação Vocacional/Profissional se relacionam.

[tie_index]Primeiro, vem o trabalho enquanto tortura[/tie_index]

Primeiro, vem o trabalho enquanto tortura

Inicialmente, o trabalho era visto como castigo divino e é seguindo esse pensamento que se dá origem à palavra, que advém do latim tripalium. O tripalium era uma ferramenta utilizada no trabalho agrícola, mas que também servia como instrumento de tortura. Assim, o trabalho também era visto socialmente como tortura.

Ao se analisar a história da humanidade, pode-se verificar que os trabalhos mais difíceis eram sempre direcionados aos mais pobres, aos escravos ou aos servos. Esses pensamentos predominaram até o fim da Idade Média, no entanto, é chocante perceber que hoje isso ainda existe e é mais comum do que se imagina.

[tie_index]Em seguida, veio o trabalho enquanto crescimento e realização[/tie_index]

Em seguida, veio o trabalho enquanto crescimento e realização

Entretanto, com o surgimento da Idade Moderna, a visão que as pessoas tinham sobre o trabalho sofreu significativas transformações. Foi uma época de intensas reformas na religião, na economia, na política, na ciência e com isso o trabalho passou de castigo à salvação. O ócio passou a ser condenado!

A partir da expansão do comércio, houve o acúmulo de riquezas suficiente para se investir nas primeiras indústrias. Além disso, a burguesia se consolidou enquanto classe social e com isso surgiu a possibilidade de ascensão social, ainda que de forma limitada.

Em síntese, pode-se considerar que por ser um momento de grande valorização do ser humano e de seu intelecto, o pensamento social que predominava era o de que o homem poderia transformar a natureza em seu favor. Isso acontecia através de nada menos que o trabalho, tornando-o algo positivo e edificante.

[tie_index]Depois, veio a sociedade industrial e o surgimento da orientação vocacional/profissional[/tie_index]

Depois, veio a sociedade industrial e o surgimento da orientação vocacional/profissional

Com o surgimento das máquinas, o trabalho que antes era manual e centrado nas famílias, agora passa a ser controlado por operários, fomentando o crescimento dos centros urbanos. Sobre esse período de tempo, pode-se afirmar que é extenso, abarca diferentes fatos históricos e em diferentes contextos sociais, mas algumas características são predominantes no pensamento da época.

O foco do desenvolvimento social era um só: Produtividade!

Buscavam-se os melhores resultados, com os menores custos e sem considerar muitos fatores, como por exemplo, a saúde dos trabalhadores, que conquistaram seus direitos com muita luta. O trabalho aqui era estável, repetitivo e eram exigidos anos de dedicação até se alcançar uma promoção. Isto é, quando existia essa possibilidade!

A Orientação Vocacional surge nesse período como uma forma de identificar as pessoas mais aptas a cada função, nesse contexto a vontade do orientando não era considerada. Predominava a máxima “O homem certo no lugar certo”! Além disso, os Testes Vocacionais tinham muita importância, já que possibilitavam identificar as características individuais de cada um.

[tie_index]Agora, vivemos no mundo do trabalho contemporâneo![/tie_index]

Agora, vivemos no mundo do trabalho contemporâneo!

Apesar das experiências de cada ser humano serem únicas e de não ser viável generalizar situações, pode-se perceber que, nos dias de hoje, nossa sociedade heterogênea carrega fragmentos de muitos pensamentos do passado. O trabalho enquanto prisão, castigo e adoecimento é a realidade de muitos, a entrega de bons resultados é a exigência básica e quem não trabalha é considerado “vagabundo”.

A globalização e os avanços tecnológicos da era contemporânea trouxeram muitas consequências e uma delas foi o aumento do desemprego. Toda a ideia de vida ganha e de estabilidade que se tinha antes, hoje não existem mais, sendo que nem mesmo a preparação acadêmica é capaz de garantir esse lugar.

Muitas profissões foram desfeitas por causa da instabilidade do mercado e se faz cada vez mais necessário que os profissionais se reinventem constantemente, processo que nem sempre é fácil de se acompanhar. No entanto, mesmo em meio ao caos, ainda existem casos de sucesso, profissões que nasceram, negócios que cresceram e profissionais que são genuinamente realizados.

[tie_index]Assim, chegamos na Orientação Vocacional/Profissional do século XXI[/tie_index]

Assim, chegamos na Orientação Vocacional/Profissional do século XXI

O tempo passou, o mundo mudou, a visão social do trabalho se transformou e psicologia acompanhou tudo isso trazendo também um novo olhar sobre a Orientação Vocacional, atualmente chamada de Orientação Profissional e de Carreira.

Quando ofertado por psicólogos, é um serviço que se propõe a promover o autoconhecimento dos orientandos quanto a interesses, valores, autoconceito, personalidade, dentre outros.

Entretanto, diferencia-se da psicoterapia por ser um processo com início, meio e fim bem definidos e que incentiva a busca por informações e contato com áreas profissionais. Mas, ao contrário do que era feito em seu surgimento, agora o orientando é ativo e vem antes de qualquer atividade técnica aplicada. Elas ainda são valiosas, porém coadjuvantes.

Dessa forma, a Orientação Profissional e de Carreira ajuda as pessoas a resgatarem suas identidades e a construírem seus projetos de vida profissional de forma mais consciente e genuína. Trabalhar é algo que faz parte da vida em sociedade e encontrar o sentido do trabalho na sua vida pode ser a diferença entre tortura ou realização.

Referências

  1. BERTANI, Íris Fenner; BARRETTO, Sirlene Aparecida Pessalacia. As transformações no mundo do trabalho e as consequências na subjetividade dos indivíduos. Katálysis, Florianópolis-SC, v. 7, n. 2, p. 203-207, jul./dez. 2004.
  2. LASSANCE, Maria Célia; SPARTA, Mônica. A orientação profissional e as transformações no mundo do trabalho. Revista Brasielira de Orientação Profissional, v. 4, n. 1-2, p. 13-19, 2003.
  3. RIBEIRO, Marcelo Afonso. Orientação profissional: uma proposta de guia terminológico. In: Compêndio de orientação profissional e de carreira, volume 1: perspectivas históricas e enfoques teóricos clássicos e modernos. São Paulo, SP: Vetor, 2011.

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